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3 perguntas a fazer ao visitar uma vinícola

por Lana Ruff
Vinhas em Tabuaço, no Douro, propriedade da primeira vinícola onde trabalhei – Foto: Divulgação

Já te aconteceu chegar a algum lugar ou ser deparado/a com um tema interessante, mas totalmente inédito, e ficar um pouco atônito/a com aquilo, de forma a não conseguir pensar em maneiras de se familiarizar com ele? Na última semana vivi uma situação que me fez lembrar o início da minha trajetória com o vinho, em 2011. Eu vivia em São Paulo, não tinha 20 anos completos e começava a conhecer partes isoladas da cadeia produtiva. Via o vinho chegar à prateleira, ao restaurante, à mesa, à taça. Via-o chegar à boca das pessoas que comentavam que Cava é diferente de Champagne mas igual mas diferente (mas igual) e que “mis en bouteille au château” era uma coisa boa.

Durante os anos seguintes comecei a trabalhar numa start-up, mergulhei no aprendizado, nas degustações, leituras e conversas que pudessem me dar novas peças pra entender como a engrenagem funcionava. Faltava uma. Foram quatro anos de feliz matrimônio com o vinho até que eu o pudesse ver por trás da cortina de cimento de São Paulo e chegasse ao seu local de produção. Em 2015 visitei um vinhedo pela primeira vez, numa viagem a trabalho, e comecei bem: por Bordeaux.

Eu conhecia o vinho, mas não conhecia a vinha. Foi intimidante vê-la de perto, porque eu sabia que havia muito o que aprender, mas não tinha ideia de como começar. Não me ocorriam as perguntas. Idade, poda, condução, rendimento, tratamentos, riscos, duração do ciclo vegetativo, a nada disso eu tinha acesso. Levou alguns aninhos até eu pôr as mãos na terra e deixar as perguntas virem dali em vez dos livros. Também ajudou circular perto de pessoas que já sabiam o que perguntar e me abriam esses caminhos. “Toma, Lana, põe esta lente aqui”.

Pra quem quer novas lentes, quer interpretar a experiência de uma visita a uma vinícola com um olhar mais crítico, deixo aqui 3 sugestões de perguntas a fazer à pessoa que te recebe. Produtor/a, dono/a, enólogo/a etc. A ideia é transcender um pouco a abordagem do vinho pelo vinho e ter ferramentas para absorver informações que dêem um sentido mais panorâmico à visita.

1. Que aspectos do seu trabalho se conectam com o seu território?

Ou seja, de que forma os vinhos produzidos manifestam as características desse lugar? Aqui entendemos se o vinho ali feito poderia surgir de qualquer outro canto no mundo, ou se é próprio do território. Pra quem curte o termo, é saber se o vinho “expressa o terroir”. São mantidas tradições, é saudável o solo, são respeitadas as características primárias da fruta? Desconfie do amigo que faz suco de barrica e diz que seus vinhos são a manifestação pura e límpida dos solos locais.

2. Como esse trabalho se relaciona com a comunidade ao redor?

Esse lugar, que também é o lugar de outros seres, sofre as influências dessa exploração (“exploração” aqui tem um sentido neutro de empreitada agrícola para uso dos recursos naturais). Quais são esses impactos? De que forma as pessoas ao redor, a paisagem, a biodiversidade e o patrimônio cultural se beneficiam porque existe esse projeto?

3. O que te motivou a fazer isso tudo em primeiro lugar?

Uma pergunta mais pessoal permite saber o core de princípios que regem o trabalho ali, e como eles se relacionam com os planos a seguir.

Repare que nenhuma das perguntas pretende saber se a conversão malolática ocorreu integral ou parcialmente, nem a porcentagem de barricas de primeiro e segundo uso. Essas também são perguntas válidas, claro que são, mas dificilmente são as que vão mostrar os valores por trás da taça. Vale brincar nessa investigação pura e simplesmente porque consumir um produto em que se acredita porque se sabe que ali há um serviço maneiro, um senso de responsabilidade, um propósito pra além do tostão, é mais gostoso.


Lana Ruff
é Mestre em Inovação em Enoturismo pelas Universidades de Tarragona, Bordeaux e Porto, há anos trabalha com comunicação de vinhos e é colaboradora de enoturismo da Única – Guia de Vinhos.

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